sexta-feira, novembro 30, 2007

ARD Lenda viva e raivosa


Materia do correio Brasiliense 30/11/07

Pioneira na cena hardcore brasiliense, a banda ARD, do Gama, estréia em CD com Síndrome do emputecimento progressivo

Daniela Paiva
Da equipe do Correio

Em 20 anos de som, a banda ARD só fez crescer sua lista de motivos para revolta: punk na base

O número de itens que irritam o ARD não parece ter reduzido o tamanho da lista indignada nos mais de 20 anos de existência e 28 formações da banda do Gama. Tome como exemplo temas de Síndrome de emputecimento progressivo, gravado há três anos e que, finalmente, ganha vida nas lojas underground da cidade este mês. O mundo não ficou menos violento nem os jovens pararam de consumir drogas e modismos. E, pelo andar da desordem e do regresso do país, inspiração para novos discos não faltará.

“Penso o tempo todo em parar, mas isso só se justificaria se conseguíssemos mudanças na sociedade”, afirma o vocalista Gilmar Batista, 43 anos, o único remanescente da fase em que a banda batizou-se de Stuhlzäpfchen von n, que significa, em alemão, supositório nuclear. A nomenclatura curiosa, na verdade, escondia, logo no início, a tendência ao discurso social. “A gente surgiu com a ideologia punk. Não aceito o sistema do jeito que está.”

Segundo o grupo, Ataque às hordas do poder, split com B-sbh em vinil, gravado em 1986, foi o primeiro registro hardcore do Centro-Oeste. “As bandas da época tocavam de um jeito mais suave, Detrito Federal, Legião, Capital etc. A gente era hardcore, menino de rua que não tinha instrumento. Ensaiava na sala de casa com catálogo telefônico e tampa de panela como bateria.”

A sigla ARD (After Radioactive Destruction, ou seja, depois da destruição radioativa) passou a ser adotada a partir do split. Em 1988, saiu o primeiro LP, Causas para alarme. Cinco anos depois, lançaram o EP de sete polegadas My Brazil: better 4 than nothing e participaram de várias coletâneas. De acordo com a página da banda no MySpace (www.myspace.com/ardhc), até Jello Biafra, ex-vocalista do Dead Kennedys, enviou e-mail empolgado com o som dos brasilienses. No ano passado, saiu um tributo à banda pela Independência Records, com nomes locais como Kaos Klitoriano, Death Slam, DFC e Besthöven.

A demora para o primeiro CD surpreende pela trajetória reconhecida no underground. “As músicas quase caducaram”, admite Gilmar. Atualmente, o ARD conta com Vander Batista no baixo, Rafael Ciampi e Maurício Libardi nas guitarras e Juliano Lopes na bateria. As intempéries até o disco desembarcar em Brasília prontinho foram desde uma pane no estúdio, que quase pôs o trabalho a perder, até um desvio de rota. “A fábrica de Manaus mandou para São Paulo e não para cá. Era para ter saído em setembro.”

E o que deixa o ARD fulo da vida atualmente? “Com tanta evolução, parece que a gente está a um passo do primitivismo”, queixa-se Gilmar. “A gente não suporta o discurso imperialista, a falsa política do Brasil, a violência em todos os sentidos. Acho incrível o Brasil não ter política pública para a juventude e os meninos de rua.” Isso sem falar no meio ambiente, na guerra, no racismo, na corrupção… Se seguirmos com a lista, o jornal não chega à sua casa.

MANIFESTO INCONFORMISTA
Num mundo cada vez mais acostumado com desigualdades, atrocidades e alienação, o ARD faz manifesto e convocação com Síndrome do emputecimento progressivo. Fala de realidades que seguem despercebidas pela sociedade de olhos vendados, como o alto índice de suicídio no Shopping Pátio Brasil. Retrata o cenário triste e violento, mas, acima de tudo, transmite esperança. Lembra que é possível mudar. E esse talvez seja o grande mérito da lenda hardcore. A importância de uma banda como o ARD é inquestionável. O registro do seu inconformismo, mesmo que tecnicamente soe como rascunho, também.

SÍNDROME DO EMPUTECIMENTO PROGRESSIVO
Estréia em CD da banda brasiliense ARD. Produzido por ARD. 14 faixas. Lançamento Alea Records. Preço: R$ 15
. MySpace: www.myspace.com/ardhc ***

sábado, novembro 24, 2007

Reminiscências de uma Brasília perdida no tempo

Estou disponibilizando aqui uma entrevista de uma banda bem antiga de Brasilia chamada ARTE NO ESCURO. Essa entrevista peguei do site carcasse.
Marco inicial do gótico nacional, o ano de 1985 viu os primeiros registros de bandas como o Muzak, de São Paulo, além de fazer da cidade de Brasília uma incubadora de bandas que, além beber das fontes pós-punks inglesas, assimilavam o estilo e a atmosfera sonora de bandas como Cocteau Twins, Bauhaus e Joy Division.

Antes disso, influências do gótico inglês eram notáveis até mesmo em bandas "comerciais" como RPM, mas sempre havia um atenuador, como o contraponto eletrônico ou, no underground, a adição de sonoridades nacionais (vide o experimentalismo de bandas como Black Future, Chance e Fellini).

Então, o que diferenciava a primeira leva pós-punk daquela safra pós-85? Naquele ano, por exemplo, o Finis Africae tocava "Kick in the Eye" num de seus shows e a apresentava como uma canção de "um conjunto de punks góticos ingleses, o Bauhaus". Se São Paulo tinha as galerias de lojas importadoras de discos, Brasília, igualmente privilegiada, tinha nos filhos dos diplomatas pequenos e eficientes focos de difusão cultural. Não espanta, portanto, o grau de acuracidade com que uma banda como o Bauhaus é citada ao vivo. Havia informações abundantes; além disso, havia muita vontade de produzir algo afim, sendo a banda 5 Generais o exemplo cabal da emulação sonora de então.

Tais bandas não eram casos isolados de uma subcultura limitada a "ilhas" urbanas. Havia intenso diálogo, o que se comprova por uma filipeta que naquele ano divulgava justamente uma apresentação com as bandas Finis Africae, Detrito Federal, 5 Generais, A+ e… Arte no Escuro. Quanto à última, que naquela apresentação estreava muitíssimo bem acompanhada, podemos afirmar que sua trajetória configura um "passo além" rumo a uma sonoridade que não mais se via como herdeira de tradições brasileiras, mas como uma legítima encarnação pós-punk, de cariz gótico e intimista.

Fundada naquele mesmo ano, a banda contava com Lui (voz), Pedro Hiena (baixo e letras), Adriano Lívio (bateria) e Paulo Coelho (guitarra). Já em sua primeira apresentação, a banda protagoniza cenas que serviriam de prólogo à sua lenda: ao cantar "Beije-me Callboy", canção sobre o submundo brasiliense com cenas de prostituição e suicídio, o vocalista Lui despeja um recipiente de tinta negra sobre si, num happening até hoje comentado pelos presentes. Musicalmente, a banda já iniciava com uma maturidade invejável, mas os anos seguintes provariam que havia muito ainda a realizar.

Poucos meses após a primeira apresentação, o vocalista Lui deixa a banda e dá lugar à jovem Marielle Loyola, então recém-saída da Escola de Escândalo, onde fazia os vocais de suporte. O talento, a presença e o estilo da nova vocalista serviram como um enorme diferencial naquele momento de efervescência musical, e as rádios passaram a executar algumas faixas da fita de demonstração da banda, como "Beije-me Callboy" e "Na Noite". Em 1987, o Arte no Escuro foi contratado pela EMI e o álbum intitulado Arte no Escuro (1988) seria lançado poucos meses depois, com evidentes amostras do impacto musical e do apelo visual da banda. Ironicamente, comenta-se (no livro Dias de Luta, por exemplo) que a Escola de Escândalo, banda que expulsara Marielle, foi preterida pela gravadora, que preferiu apostar justamente em sua nova e instigante banda.

Após o lançamento do LP, Marielle funda a banda Volkana, de Thrash Metal, mudando-se para São Paulo. O Arte no Escuro então encontra sua dissolução e seu único lançamento de mercado torna-se cada vez mais cobiçado pelos colecionadores. O contrato com a gravadora, aliás, expirou em 2004, o que deixa o trabalho disponível para negociação por outros selos. Uma eventual edição em CD não só serviria para recompor o quebra-cabeça da história do rock nacional, como também daria algo palpável às legiões de novos apreciadores da banda, que se lamentam de só disporem de arquivos digitais, sem algo mais "palpável". Em CD, a banda teve apenas uma canção lançada ("Beije-me Cowboy"), incluída por Charles Gavin (Titãs) na compilação Discoteca Básica: Pop Rock Nacional dos Anos 80, o que é bom, mas ainda é muito pouco.

Atualmente, Marielle se dedica à banda Cores D Flores e Pedro vive em Londres, enquanto os demais ex-integrantes parecem ter abandonado a música. Conversamos com os dois primeiros a respeito da trajetória do Arte no Escuro, verdadeiro patrimônio da música brasileira dos anos 80.

Muito obrigado por responder a estas perguntas. É uma honra estar em contato com vocês.

Para começar, eu gostaria de falar sobre os anos que antecederam a formação do Arte no Escuro. Brasília era um saudoso celeiro de bandas punks, e vocês integraram as bandas Os Sociais (caso do Pedro), e Escola de Escândalo (caso da Marielle). Como vocês descreveriam esse tempo e as duas bandas cujas histórias se confundem com as suas?

Pedro: Eu e Paulo éramos da "tchurma", como dizia o Renato "Manfredo" Russo, e sempre estávamos envolvidos com o pessoal da Legião, Plebe e Capital. Eles começaram a viajar para o eixo Rio—São Paulo para tocar, e a gente pensava: "se eles conseguiram, por que não tentar?". Anos antes, eu já escrevia letras. "Psicopata", do Capital Inicial, por exemplo, é de minha autoria, e eu tinha um livro cheio delas. Paulo tocava guitarra e eu sempre quis tocar baixo. Os Sociais foi uma das minhas primeiras bandas e, que eu me lembre, só fizemos um show. Eu cantava e escrevia as letras... Todos d'Os Sociais, fora eu, eram filhos de diplomatas, incluindo o Nick, que era alemão. Sempre havia a sombra de que alguém iria deixar a cidade e acho que foi isso o que aconteceu no final. Só não lembro quem partiu... Já ouvi muitos rumores sobre Os Sociais. Eu mesmo não me lembro de nenhuma música e nem do que eu cantava! Tem um mp3 por aí que na verdade foi uma jam session num boteco, eu e um monte de gente, e resolveram dizer que é d'Os Sociais. Pure bullshit! Que eu saiba, ninguém tem algo gravado da época.

Marielle: Bem, na verdade, as lembranças que tenho são as de uma pré-adolescente normal integrando-se a um grupo de pessoas com informações variadas e já criando seus ídolos, que, naquele momento, eram o Renato Russo e o Marcelo Bonfá, nosso galã (risos). O meu primeiro ensaio com o Escola de Escândalo foi engraçado... eles ensaiavam no "closet" da casa do Alessandro "Itália" (o pai dele era embaixador da Itália, acho). Eu cheguei e só conhecia o Itália, e ele foi me apresentando aos outros componentes: Bernardo era o vocalista, irmão mais novo do André X, baixista da Plebe, grande poeta. Geraldo era o baixista, irmão do Loro Jones do Capital, muito boa pessoa e divertido, daí eles me apresentaram o Fejão como um tarado sexual, dizendo que tudo correria bem se eu não chegasse muito perto! (risos) Na minha opinião, ele é um dos maiores guitarristas que esse país já teve, tornando-se um irmãozão... saudade do Nego Véio... Mas o que me assustou mesmo foi a altura dos caras. Acho que o mais baixo deles tinha 1,87 m de altura. Eu, com meu 1,69 m me sentia uma formiguinha ali. Bem, como vocês podem sentir, a nossa convivência sempre foi legal com a turma e tudo era bem divertido... um bando de malucos alegres.

Vocês ingressaram na banda em momentos diferentes. Seria ótimo poder saber um pouco mais sobre o momento em que cada um passou a integrar o Arte no Escuro, o Pedro na formação e a Marielle na substituição do Lui como vocalista. Qual era a "proposta" inicial da banda e como se deu o convite à Marielle?
P: O Arte no Escuro no começo era eu e Paulo Coelho. Eu nem tinha baixo na época e tocava a linha do baixo em uma guitarra. Conhecia o Adriano havia tempos e lembrava que ele tocava bateria. Convidamo-lo e ele aceitou. Com o Lui foi a mesma história: sempre nos encontrávamos no Beirute para tomar uma, e ele tinha interesse em cantar. Acho que ele apareceu ou o convidamos para ver o ensaio e foi isso. Lui é pintor e muito interessado em artes plásticas. Num bate papo, ele comenta sobre um movimento artístico, onde o fotógrafo ou pintor se amarra em arame farpado, sangue saindo, e se pinta e tal. Flagelação por arte. Algo por aí. O nome do movimento era Art in the Dark. Fizemos três ou quatro shows com o Lui nos vocais e parecia que estávamos fazendo um nome. Um belo dia, Lui diz que tinha conseguido transferência de trabalho para o Rio e se vai... Marielle tinha acabado de sair do Escola de Escândalo... éramos fãs do Cocteau Twins; uma voz feminina apelou na época, e pensamos: "por que não?".

M: A minha entrada no Arte no Escuro ocorreu em um momento bem chato pra mim, na verdade, pois eu estava muito triste com minha "expulsão" do Escola de Escândalo pelo Bernardo, após uma apresentação em um programa da Rede Globo chamado Mixto Quente, no qual, das quatro músicas que nós tocamos, foi ao ar justo a que eu cantava, pois na banda eu era só backing vocal, e havia essa música chamada "Complexos" que o Bernardo fez para eu cantar. Nossa, fiquei muito mal com o telefonema dele... e pesou o fato de ele não ter me falado ao vivo, foi pelo telefone... foi punk mesmo. Então, no dia seguinte, o pessoal do Arte no Escuro me ligou dizendo que o Lui estava indo morar no Rio e que eles estavam sem vocalista... nossa, para mim foi tudo de bom, pois eu já conhecia o pessoal da banda e, claro, conhecia o som, pois lá como já te disse todos conheciam todos e todos apoiavam todos. Acho que esse era um grande diferencial do que presenciei depois em vários cenários da música pelo país... a gente podia até xingar, zoar e tudo mais nos shows das outras bandas, mas sempre estava todo mundo lá (risos)!!! Éramos adolescentes felizes!!

Marielle Loyola Não é raro ouvirmos testemunhos entusiasmados de apresentações ao vivo do Arte no Escuro repletos de cenas antológicas. Dizem que, certa vez, por exemplo, o Lui despejou tinta preta sobre o próprio corpo cantando "Beije-me Callboy". E para vocês, quais foram os momentos "ao vivo" mais memoráveis?
P: Esse "show da tinta", na verdade. Foi o nosso primeiro show... Tivemos muitos shows memoráveis, lembro-me de um no Teatro Galpão, em Brasília, já com a Marielle, chamado "Feira de Música", que acontecia toda segunda-feira. Cada banda tocava duas músicas e era isso. A platéia não hesitava, atirava tomate e o diabo se a banda fosse ruim. Tocamos duas músicas e não atiraram nada; no final, aplaudiram. Acabamos sendo convidados para fazer uma noite especial só do Arte no Escuro. Nossos shows tinham muito clima e energia, coisa que no disco acabou sendo pasteurizada, o que foi uma pena. Na minha opinião, o registro acabou não fazendo justiça ao Arte no Escuro.

M: Putz... na verdade, com o Arte tenho várias recordações legais, o show em Fernando de Noronha... acho que fomos a única banda de rock a tocar lá... meu... o povo gritava muito com a iluminação, eles piraram realmente. O show histórico no Teatro Nacional também, onde fizemos do palco a platéia... foi assim: colocamos arquibancadas no palco e nós, músicos, ficávamos em pequenos tablados individuais. Foi o show de lançamento do disco, muito legal. Na verdade, tínhamos um superempresário, também moleque como a gente na época, mas que sempre soube agilizar e potencializar nossa banda: Luiz Fernando Artigas (Fegê), que hoje é um grande articulador político de Brasília.

Bandas como Gang of Four e Joy Division são muito citadas como influências pelas bandas brasilienses de meados dos anos 80. No caso do Arte no Escuro, vocês acham possível apontar alguns nomes que lhes serviram como referências musicais? Aproveitando o gancho, o título de "Joy" tem alguma relação com o Joy Division?
P: Eu, Paulo e Adriano sempre fomos apaixonados pelo Joy Division. Na época, acho que tivemos influência do Echo & the Bunnymen, Cocteau Twins, The Cure, Siouxsie & The Banshees, The Sisters of Mercy, Magazine e The Smiths, para citar algumas. "Joy" foi feita sem esta intenção, mas acabou tendo todas as marcas do Joy Division... Na verdade, até abrimos alguns shows com ela e nunca pensamos em pôr letra ou gravar.

M: Eu sempre tive uma salada de influências em meu repertório que, acredito, foi muito trabalhado pelas minhas amizades. Sempre fui de circular em várias turmas, então eu ouvia muito Cocteau Twins, The Cult e U2, com o pessoal do Arte, mas o Negreti (Legião) e o Ameba (Plebe) não saiam lá de casa, então eu ouvia muito Dead Kennedys, punk rock e hardcore de verdade e, como o Fejão também ia muito lá em casa, e sempre trazia vídeos e cassetes para a gente ouvir, já viu, né?... aí era metal na cabeça: Metallica, Slayer, Ozzy, Suicidal Tendencies e até o metal farofa!!! (risos) Bem, por aí você vai vendo como as coisas aconteciam, tanto que o Ameba, o Negreti e o Fejão depois montaram uma banda chamada Dentes Quentes, onde eles tocavam Dead Kennedys e um pouco do metal. Já em São Paulo, quando me mudei com a Volkana, conheci o rap... o hip-hop, através do Thaíde e do DJ Hum, que participaram do disco da Volkana... e aí... mais uma paixão... Filtrando tudo isso, tiro todas as sonoridades que tenho em minha alma hoje... a belíssima voz de Elizabeth Fraser, do Cocteau, a simplicidade do Ozzy, a garra do Jello Biafra, o peso do Metallica, a exatidão métrica do hip-hop em algumas coisas e, claro, a paixão pelo Bono... ai, ai... rolou até paixão pelo Bon Jovi e Skid Row, acredita??? Eu trago tudo isso para a Cores D Flores... peso e melodia!

Graças ao excelente site que vocês prepararam, podemos ouvir versões alternativas de várias das canções da banda, além de termos acesso a verdadeiros documentos históricos, entre fotos, filipetas e artigos de época. Como vocês avaliam a repercussão desse material?

P: Não tenho nem idéia de quantas pessoas já entraram no site. Fiz ele sozinho com o material que eu e o Paulo Coelho havíamos guardado. Fora o Paulo, também consultei o Adriano sobre idéias. A intenção nunca foi a de divulgar o Arte no Escuro, mas sim de ter algo para lembrar, um arquivo, nada mais. Daí o material nele. Coloquei tudo que tínhamos achado na época. Daí o "RIP" na main page.

M: Bem massa, né? Pois essa entrevista mesmo só está rolando por causa dessa história que não pode morrer nunca, essa é a história do rock candango e não pode ser esquecida ou ignorada... por isso que me divirto quando alguém compara meu atual trabalho ao da Pitty... adoro o que ela fez no rock nacional, acho ela extremamente talentosa, canta pra caramba e é uma ótima compositora, mas, cara, tem muito jornalista que ignora essa história e quer falar do rock nacional. Acho que informação é importante pra qualquer um, para jornalista então... nem se fala, né??

Excluídos os materiais divulgados no site da banda, existem ainda registros inéditos do Arte no Escuro, como vídeos, composições, clipes?
M: Acho que essa é bem para o Pedro responder, pois eu sempre fui inútil nesse ponto para a banda... era muito moleca aprontona e nem me ligava em organizar nada, aliás, acredito hoje que foi minha imaturidade o que mais atrapalhou o Arte no Escuro... aí, Pedro... foi mal!!! Tanto que hoje na Cores quando faço esse tipo de coisa, lembro-me do imenso acervo que eu poderia ter.

P: Lembro-me de ter visto na TV o show inteiro que fizemos no Teatro Nacional de Brasília, nos bastidores da sala Villa-Lobos. Gravei-o em VHS, e minha ex-mulher fez o favor de gravar em cima Galaxy Rangers para o meu filho, porque não tinha achado outra fita... Não tenho certeza, mas acho que foi a TV Cultura de Brasília a emissora que o veiculou. Com certeza há vídeos de shows que fizemos em Brasília, o problema é achar...

Arte no Escuro (1988) Quanto às canções selecionadas no álbum Arte no Escuro (1988), notamos algumas mudanças em relação às suas versões anteriores. Além de "Beije-me Callboy" ter sido renomeada como "Beije-me Cowboy", um pequeno trecho da letra de "Celebrações" parece ter sido suprimido. Como se deram essas mudanças? Houve alguma interferência da EMI ou tudo fez parte da maturação natural do material?
M: Outra que tem de ser respondida pelo Pedro, pois eu cantava mas não tinha muita participação nas composições, a não ser nas melodias de voz. Lembro-me que "Celebrações" estava muito longa e repetitiva; quanto a "Beije-me Cowboy" eu nem sabia que tinha mudado de nome, só sabia que a intenção dela era a de falar sobre um garoto de programa, mas só. Aliás, no disco do Arte no Escuro tive a minha primeira oportunidade de compor uma letra, o que devo ao Pedro, com quem, com certeza, aprendi muito. Pensando bem, aprendi com os melhores: o Renato (Russo) sempre me dava toques sobre palavras e como usá-las, métrica... o Pedro me fez ler muitos livros legais, além de falar de amor de uma maneira obscura e tão romântica, cantar as letras do Bernardo (Escola de Escândalos) também me ensinou como usar palavras sem nenhuma sonoridade, mas com muitas possibilidades.

P: Só foi maturação do material. No LP, foi burrice não termos gravado "Inocência", pois era uma das nossas melhores músicas em shows. Por incrível que pareça, tanto a EMI como a produção, que foi inexistente, nos deram carta branca no estúdio.

Uma belíssima parceria entre a banda 5 Generais e Marielle ("Outro Trago?") havia sido gravada para a coletânea Outros Rumores, que nunca foi lançada. O Arte no Escuro também participaria dela?
P: Acho que já estávamos em contato com EMI e outros selos na época e não queríamos arriscar lançar algo por um selo pequeno quando gravadoras grandes estavam demonstrando interesse em nós.

M: Essa música, se não me engano, saiu agora, no Rumores II. Recebi a versão remixada e "tá o bicho", aliás, o 5 Generais é outra banda da época muito do cara...mba (risos).

Em 1988, jornais e revistas apontaram influências do pós-punk inglês na sonoridade do Arte no Escuro. A Bizz, por exemplo, apontou um "clima gótico" nas canções da banda e registrou sua recusa ao rótulo "dark". O que vocês diriam sobre tais associações?
P: Na época, negamos, pois era o tal de rótulo, blábláblá de mídia tentando criar polêmica para vender ou pegar a atenção do público: "há um novo bicho pra vendermos, e ele se chama dark"... Acho que estávamos mais para Echo & the Bunnymen que para The Sisters of Mercy.

M: Meu, fomos a primeira banda gótica ou dark do país, não adianta fugir desse rótulo. As letras nos submetiam aos climas "escuros" do amor e da vida. Acho que Álvares de Azevedo gostaria muito de ouvir o Arte no Escuro (risos).

Pedro Hiena Vocês já chegaram a negociar o relançamento do Arte no Escuro em formato digital? Vocês arriscariam alguma explicação para o inexplicável atraso da gravadora em disponibilizá-lo novamente?
P: Por volta de 1995, lembro-me de ter ouvido falar que a EMI estava interessada em ter-nos no estúdio para gravarmos material novo. Se foi verdade, não sei. Todas as bandas dos anos 80 estavam regravando ou voltando. Eu já estava morando em Londres na época e lembro-me de ter dito a alguém que só voltava para o Brasil se me pagassem U$ 1,000,000.00. Não acho que vão lançar o CD. No final das contas, não vendemos muitas cópias.

M: Eu e o Paulo Coelho até pensamos em tentar um relançamento. Fizemos um contato meia boca e desistimos. Na verdade, uma empresa como a EMI não se interessa pela história ou por registrar documentos com que o rock nacional seja memorizado ou eternizado. Para eles, o que conta é a grana, bufunfa, din-din, o som do produto não importa, mas sim o som da máquina registradora. Ainda bem que existem pessoas como você e esse seu trabalho tão engrandecedor da cena nacional, porque senão a maioria dos jovens ouvintes não teria a oportunidade de saber como começou ou de onde vieram nossas raízes musicais.

Atualmente, existem bandas – como a brasiliense Últimos Versos – que tomam o Arte no Escuro como inspiração e parâmetro musical para seus trabalhos. Como é, para vocês, saber que o Arte no Escuro ainda faz escola?
P: Uau. Nem tinha idéia. Legal. Interessante. Quero ouvir esses carinhas.

M: Pô... eu me sinto extremamente orgulhosa, várias pessoas entram em contato para trocar idéias e passando sempre uma vibe positiva sobre o trabalho do Arte. Em Brasília há também a Morffine, do Phélix do 5 Generais, que também vai pra esse estilo e confessa a influência do Arte. Muito bom... é muito dez ser útil pra alguém (risos).

E quanto ao fim da banda? A que vocês o atribuem?
P: A EMI terminou nosso contrato. "Lambada" virou febre nacional (não estou brincando, de verdade!). Shows ficaram muito difíceis de arrumar. Marielle decidiu cantar em uma banda de heavy-metal e, para ajudar ainda mais, havia a vida. Acho que cansamos de nadar contra a corrente. Amor à musica nunca pagou contas.

M: Bem, eu me sinto bastante culpada, como já assumi anteriormente. Fui irresponsável em vários momentos importantes da banda e sei que a falta de maturidade foi fator derradeiro. A assinatura do contrato do Volkana com a Eldorado também pesou... Eu me apaixonei pelo metal... e quando vi, já era. Sei que magoei pessoas legais com a minha falta de continuidade e loucuras... mas já foi.

Após a dissolução da banda, em quais outras bandas os membros do Arte no Escuro tocaram? Sabemos do Volkana e do Vollume, bandas que contaram com a voz preciosa da Marielle, além do Cores D Flores, sua atual banda. Você poderia comentá-las, Marielle? E quanto ao Pedro, ao Adriano e ao Paulo? Em quais outras bandas tocaram?
P: Eu e Paulo tivemos uma banda que nunca saiu do ensaio ou estúdio. Depois disso, fui convidado e acabei tocando no "new" Detrito Federal por quase um ano. Viajei o Brasil inteiro com eles tocando baixo e acabei escrevendo algumas letras e músicas. Também no Detrito, por uma época, estava o Eduardo "Balé", baterista do Escola de Escândalo. Aqui no Reino Unido, por volta de 96-98 fiz mix de música eletrônica com jazz, ou Breakbeat. Tenho um estúdio no meu laptop e toco baixo, violão e até teclado quando o santo baixa. Que eu saiba, Adriano e Paulo aposentaram as chuteiras em termos de música.

M: Mantenho contato com o Adriano, que conseguiu realizar seu sonho de ser diplomata, o que eu acho muito importante... realizar sonhos... com o Pedro, acho que falei pouquíssimas vezes, pois ele foi para Londres; com o Paulo também falei poucas vezes, mas sei que ele também realizou seu sonho de montar uma empresa de arquitetura. Quanto ao meu destino, fui para o Volkana, que teve uma ótima aceitação do público e da mídia, mas tive de me afastar quando meu irmão ficou doente e veio a falecer (ele era um grande amigo, parceiro... um tudo pra mim, aliás ele até participa do disco do Volkana), voltando pra Curitiba (minha cidade natal), onde minha família precisava de mim naquele momento. Já estava casada com o McCoy, que é um grande guitarrista e que esteve sempre ao meu lado nos quase quatro anos em que me neguei a cantar, convencendo-me a voltar a compor e me agilizar formando a Cores D Flores, após ir a um show do Capital Inicial no qual o Loro Jones e o Dinho me incentivaram muito também a voltar. A banda Vollume, na verdade, foi uma transição da Cores para um som mais pesado, mas sempre foi a Cores, embora com outro nome durante seis meses. Hoje, a Cores D Flores já está se fixando no mercado independente. Já temos três demos lançadas, o Entre Sonhos e Pesadelos, onde exponho as aflições de sonhar, amar e odiar neste planeta, quase uma coletânea dos anos anteriores da banda, contendo versões acústicas em gravações caseiras, mas que pra mim tinham de ser registradas, e naquele momento... coisa de maluco mesmo (risos). Agora estamos finalizando o nosso primeiro CD gravado em estúdio profissional, intitulado Paixão. Nele, temos algumas regravações do Entre Sonhos e Pesadelos, mas lá fica bem mais claro nosso peso, nossa meta musical e nossa melodia, minhas influências, tanto nas letras onde exponho meu respeito aos sentimentos confusos e maléficos do ser humano, e declaro minha Paixão e respeito ao meu público. O CD estará pronto para lançamento em março, e espero, através do seu site, ter a oportunidade de mostrar ao seu grande público esse meu trabalho atual, firmeza??? Também faço a minha parte aqui em Curitiba tentando agilizar uma maior amostragem da cena local através do meu programa na 96 Rádio Rock, o Geração Pedreira e em um site voltado à música paranaense – www.movimentoleitequente.com.br – que, a partir de janeiro, se tornará uma rádio... 24 horas de música paranaense na Web... "é nóis"! (risos)

Nós, entrevistadores, nunca somos capazes de fornecer oportunidades de as bandas expressarem tudo aquilo que seus apreciadores gostariam de ouvir. Por isso, deixo aberto este espaço para que vocês transmitam o que bem desejarem, com toda a liberdade possível. Muitíssimo obrigado pela entrevista!
P: Obrigado pelo interesse e, por favor, se tiverem algo que não está no site do Arte no Escuro, mandem-me que o incluirei, farei um link para o seu site e, claro, incluirei os devidos créditos.

M: Olha só... discordo da sua afirmativa na pergunta. Vocês entrevistadores são os responsáveis pela nossa visibilidade e nossas grandes oportunidades, como esta de estar aqui, de nos aproximarmos mais das pessoas que tanto valem para a gente... os que ouvem nossas canções, nossos corações. Pois para o músico, pelo menos eu penso assim, o mais importante é chegar aos corações através de melodias e poesias. Valeu mesmo, Cid! Conte sempre comigo.

quinta-feira, novembro 22, 2007

Agenda cheia: 32 bandas anunciam

shows esta semana no site do Zine Oficial

Consolidando o endereço eletrônico www.zineoficial.com.br como um canal direto com o público do circuito underground do DF e Entorno, 32 bandas anunciam shows esta semana no site. Duas bandas de fora do DF estão devidamente somadas nessa conta.

Como parte da divulgação do lançamento do CD Carne, MUKEKA DI RATO (ES) tocará na sexta edição da LESTO CONVIDA, ao lado da anfitriã LESTO e das convidadas INNOCENTS KIDS e MAKACONGS 2099, sexta, dia 23 de novembro às 21 horas, no Black Out Bar, com ingressos anunciados a R$ 15,00.

No dia seguinte, sábado 24, LIXOMANIA (SP) estará por aqui para soprar as velinhas na esperada e comentada festa em comemoração aos 30 anos da música punk ao lado de DETRITO FEDERAL , OS MALTRAPILHOS e DISSÔNICOS. O local também é o Black Out Bar, no clube da ASCEB, 904 sul, a partir das 18 horas, com entrada a R$ 10,00.

Também no sábado (24/11), uma cantora solo e 12 bandas de rock, entre elas a ELFFUS, vencedora do prêmio Posto da Torre de Música em 2007, tomarão o estacionamento ao lado do Ginásio de Esportes do Cruzeiro para participar das comemorações pelo aniversário da cidade, a partir das 18 horas com acesso gratuito.

Puxando a sardinha para nossa brasa, vamos participar domingo, 25 de dezembro, de uma exposição de zines, mostrando os números impressos do Zine Oficial para quem não teve a oportunidade de ver essas edições (até agora foram 12 volumes). A Exposição de Fanzines será no ROCKERS BAR, na CNF 03, lote 01, loja 01, na Avenida SAMDU, em Taguatinga Norte, durante o evento "DANADA, FESTIVAL DE MÚSICA PESADA" , com apresentações gratuitas das bandas TERROR REVOLUCIONÁRIO, PODRERA, PHRENESY, PESTICIDE e NO FATE .

Confira essas e outras atrações no site do Zine Oficial: www.zineoficial.com.br .

Abraços,

Tomaz
(editor do Zine Oficial)

segunda-feira, novembro 12, 2007

ONG afasta G4 Produções do Porão do Rock

NdE/: esta na integra a nota q o porão do rock soltou. Enchem mais linguiça do que explicam o episódio envolvendo conselheiros da ong. Leiam e tire suas proprias conclusões.

ONG afasta G4 Produções do Porão do Rock
Em reunião extraordinária realizada na noite de 6 de novembro de 2007, a ONG Porão do Rock, detentora oficial da marca Porão do Rock, deliberou que:

. A G4 Produções está afastada da produção dos eventos ligados à marca Porão do Rock (Festival e Pílulas);

. Os três conselheiros integrantes da G4 Produções estão afastados das atividades da ONG Porão do Rock;

. A For Rock Promoções passa a ser a única produtora executiva dos eventos ligados à marca Porão do Rock (Festival e Pílulas).

A ONG e a produção do Festival Porão do Rock foram desagradavelmente surpreendidas pelas notícias veiculadas pela imprensa nos dias 6 e 7 de novembro, relativas à Operação Mecenas, da Polícia Federal. E, em nome de sua lisura e idoneidade, decidiram afastar a G4 Produções de todos os assuntos relativos ao Porão do Rock, pelo menos até que as investigações sobre as denúncias de corrupção no Ministério da Cultura sejam encerradas. Vale ressaltar que, de acordo com a própria Polícia Federal, não foi revelado nada que incrimine ou denigra a imagem da marca Porão do Rock e dos eventos ligados a ela.O Festival Porão do Rock, realizado anualmente em Brasília há 10 anos – sendo cinco anos com entrada franca –, é considerado hoje o maior e dentre os mais importantes festivais de música independente do Brasil, tendo reunido um público de mais de 600 mil pessoas e 234 atrações diferentes (122 do Distrito Federal, oito internacionais e 104 nacionais, de 14 estados brasileiros).

Com o apoio da ONG Porão do Rock, desde 2003, são desenvolvidas, durante o festival, diversas ações focadas em campanhas educativas, de saúde e de bem-estar social em prol do público do Distrito Federal. A mais significativa é a campanha Rock contra a Fome que, entre 2003 e 2007, arrecadou junto ao público presente um total de 130 toneladas de alimentos não-perecíveis, doadas para entidades filantrópicas cadastradas no programa Mesa Brasil, do SESC. Tal ação foi contemplada três vezes (de 2004 a 2006) pelo SESC/DF com o Certificado de Empresa Socialmente Responsável.

O prêmio é conferido a empresas públicas ou privadas que foram parceiras ou contribuíram em projetos sociais empreendidos pela instituição.Em 2007 quase 15 toneladas de alimentos foram arrecadadas e direcionadas dessa vez para a Associação Brasileira de Ação Social (ABAS), que atende a mais de 80 instituições de assistência infantil no Distrito Federal e Entorno.

Tal ação possibilitou a montagem de 730 cestas básicas completas, que atenderam a mais de 1.500 crianças carentes do Distrito Federal.Em 2004, outra ação de destaque desenvolvida pela ONG e pelo Festival Porão do Rock, em parceria com a Secretaria Nacional Antidrogas (Senad) e o Escritório das Nações Unidas contra as Drogas e o Crime (Unodc/ONU), foi a campanha Ligue-se na Música. Desligue-se das Drogas, de conscientização sobre o uso abusivo de drogas.

Nos dois dias do festival, foram distribuídos 90 mil cartões postais que alertam sobre os efeitos das drogas mais difundidas entre os jovens, como o ecstasy, a cocaína, a maconha, o álcool e o cigarro. Por tal iniciativa, a entidade recebeu das mãos do general Jorge Armando Félix, ministro-chefe da Segurança Institucional da Presidência da República, o Diploma do Mérito pela Valorização da Vida, em solenidade ocorrida em junho de 2005, no Palácio do Planalto. Em 2007, uma nova parceria com o Unodc/ONU foi desenvolvida na campanha Use música. Não deixe a droga controlar sua vida, com o mesmo objetivo da campanha anterior.Outras ações sociais realizadas:

- Fique Sabendo - Parceria com o DST/Aids, do Ministério da Saúde (2003). Conscientização sobre a necessidade do exame de diagnóstico do vírus HIV;

- Vista-se - Parceria com o DST/Aids, do Ministério da Saúde (2005). Orientação sobre a necessidade do uso de preservativos sexuais (a "camisinha"), contando com a participação massiva dos artistas posando em fotos de divulgação da campanha;

- Sexo, prevenção e rock and roll - Parceria com o Instituto Sabin (2007), que levou à arena do festival esquetes com o tema "O auto da camisinha", interpretado pelo grupo de teatro Hierofante, e distribuiu gratuitamente mais de cinco mil preservativos.

- Se Beber, Não Dirija - Parceria com a Ambev (2005 e 2006). Orientou o público a ingerir bebidas alcoólicas com moderação e, em caso de excesso, não dirigir nenhum veículo na saída do evento.

- Pedimos RG. Bebida só para maiores de 18 anos - Parceria com a Ambev (2005 a 2007). Garantiu o cumprimento da lei no Porão do Rock, impedindo a venda de bebidas alcoólicas aos menores de 18 anos.

- Coleta seletiva - Parceria com a cooperativa 100 Dimensão (2005), da cidade de Riacho Fundo (DF). Foi preparado um programa de conscientização sobre a importância da coleta seletiva na preservação do meio ambiente.

- Oficina de DJs - Parceria com o programa Picasso não Pichava (2006). Foi disponibilizada a entrada no festival de adolescentes da cidade de Ceilândia (DF) e oferecida a eles oficinas sob a coordenação do DJ Chokolaty.

- Tudo limpo no Porão – Parceria com o Serviço de Limpeza Urbana do Distrito Federal (SLU) (2007). O lixo produzido nos dois dias do evento foi coletado de forma seletiva e destinado para o SLU fazer o tratamento e reciclagem.

Em novembro de 2005, o Porão do Rock foi um dos co-fundadores da Associação Brasileira dos Festivais Independentes (Abrafin) que, desde então, vem desenvolvendo uma série de iniciativas e parcerias em prol do intercâmbio de artistas, bandas e eventos da música independente em diversos estados do país, do Acre ao Rio Grande do Sul. O festival conta, inclusive, com um representante na diretoria da Abrafin, o produtor Gustavo Sá, da For Rock Promoções, diretor artístico do Porão do Rock.

Além disso, o Porão do Rock faz parte do calendário oficial de eventos do Governo do Distrito Federal.
Diante destes números e fatos, temos a consciência da importância e relevância do Porão do Rock como palco para revelação de novos talentos, consagração de outros, além de todos os aspectos lúdicos e sociais que coexistem em sua realização. E colocamos-nos à disposição para quaisquer outros esclarecimentos que se fizerem necessários.

LEONARDO BARROSPresidente da ONG Porão do Rock

quinta-feira, novembro 08, 2007

TROPA DE ELITE verdadeiro ou falso

TEXTO RETIRADO DO BLOG TECNOSAPIENS
Detesto ver estréia de filmes, detesto cinema lotado. Detesto ter que ver um filme só porque todo mundo tá vendo e comentando. Não sou animal de rebanho. Por isso, até ontem não havia visto Tropa de Elite. Fui motivado a vê-lo, sobretudo, depois de uma discussão com uma colega de trabalho. Ela chegou toda triunfante e falou: “Olha, já parou para pensar quantas pessoas têm que morrer para você enrolar o seu baseado?”
Ela ficou parada na minha frente, puxando a blusa pra baixo e a calça pra cima, num gesto quase automático das meninas. Você tá namorando PM, Olívia? E ela: “hã?” Eu falei alto, “tá namorando PM ou tá lendo a Veja, Olívia? De onde você tirou essa frase ridícula?” E ela triunfante: “Eu vi o filme Tropa de Elite, o filme mostra que vocês, que usam drogas, alimentam o mercado negro e a violência...” antes que ela terminasse a frase eu perguntei: Olívia, pelo que me consta esse filme ainda não saiu no cinema, onde você viu o filme?” Vi em casa, como todo mundo; ela disse. Olívia, você comprou um filme pirata e vem falar de quem alimenta o mercado negro e a violência? Vá se catar Olívia! Ela saiu toda desajeitada, baixando a blusa e levantando a calça por trás, puxando o cós.
Ontem teve promoção no cinema, filmes brasileiros a dois reais, fui ver o Tropa e constatar se a Olívia tinha tirado a frase do filme ou ela interpretou errôneamente o que ouviu. Bom, a frase tava lá. E o filme é um recorte sob o ponto de vista de um policial assassino!
Entre outras coisas o filme fala de um Estado que só sobe o morro fardado, um lugar-comum. E fala de uma abstração chamada sistema. A palavra chave do filme é SISTEMA. O SISTEMA criou uma polícia militar corrupta. E um Estado Policial. Proibiu a venda de drogas, mas também colocou sob o mesmo crime plantar, dar, oferecer, transportar ou usá-las.
No entanto, sob um juízo muito discutível, o SISTEMA resolveu discriminar as drogas, dizendo as que podem e as que não podem ser comercializadas, e o critério é simplesmente não ter critério. Com a proibição, o SISTEMA criou o mercado negro. O mercado negro gerou a violência e a violência gerou o Bope. O SISTEMA criou o Bope pra matar, não para acabar com o tráfico ou a violência, mas para gerar mais violência.
Curiosamente o filme fala quase que exclusivamente de maconha. A maconha é um estupefaciente; portanto, inibe o usuário, ao invés de torná-lo forte, invencível e assassino. No mundo inteiro, o cigarro e o álcool são os maiores causadores de mortes. A cocaína e a maconha nem entram nestas estatísticas, porque sua contribuição para morte de pessoas é insignificante. A não ser quando traficantes lutam por pontos-de-venda, ou viciados matam para comprar droga, mas isso também é insignificante nas estatísticas. No entanto, na televisão o que mais se propaga é o uso de álcool. O álcool como se sabe é o maior causador de acidentes fatais no trânsito. O álcool é um conhecido destruidor de lares. O álcool e o alcolismo levam o Estado a gastar milhões de reais com o sistema de saúde só pra cuidar destes viciados.
Em Brasília, decretou-se a lei seca, por um período, e o crime diminuiu e muito. Percebeu-se que a maior parte dos crimes violentos têm o álcool como estopim. Mas o Capitão Nascimento não mata quem bebe, nem quem vende bebida. E o aspira Matias não espanca cachaceiros em butecos; o Capitão Fábio até toma uma cervejinha enquanto trabalha.
O problema é que quase todas as culturas humanas que palmilharam esse planeta, em qualquer época, utilizaram algum tipo de substância que altera a consciência: ervas, cactus, fermentação de frutos, fervura de raízes, substâncias extraídas de animais (sobretudo anfíbios), folhas, cogumelos, sementes, flores (como a papoula), raspa de tronco de árvores etc! Inclusive alguns animais se utilizam também deste recurso: macacos fabricam “cachaça” com a fermentação de alguns frutos, gatos comem ervas que os deixam alucinados etc. Não seria diferente em uma sociedade frenética como a nossa.
O problema é que o GRANDE SISTEMA não permite que os peruanos, bolivianos e colombianos vendam suas drogas em pó (porque as folhas são endêmicas, só dão em fartura naquela região). O GRANDE SISTEMA permite somente que escoceses, franceses, alemães e italianos vendam suas drogas líquidas, que são patrimônios nacionais, veja você. E não se esqueça, o proibição do álcool criou o Alcapone (quase um sinônimo) e enriqueceu a assassina e sanguinária máfia italiana. O ópio também é proibido, porque senão viraria uma fonte legal de riqueza para países como Afeganistão e Marrocos. Ora, o sistema tem um cérebro e uma ideologia! O Mc Donald's mata mais que a maconha!
Agora veja você, nas usinas de cana-de-acúcar do Brasil ocorre um vergonhoso genocídio, boias-frias que vivem no máximo 27 anos, morrem de exaustão por conta do trabalho escravo ao qual são submetidos. O SISTEMA estimula esse tipo de trabalho escravo. Quantas pessoas têm que morrer para você colocar álcool no seu carro? Law Kin Chon, o magnata da pirataria no Brasil, e que alimenta o SISTEMA com propina, explora miseráveis e mata para manter o seu negócio sujo. Quantas pessoas têm que morrer para você poder assistir a um DVD pirata ou desfilar com uma falsificação da Louis Vuiton? A lista é enorme. Se um filme pode ser resumido a uma frase, a um jogo de retórica tão lugar-comum como esse, ou o filme é muito ruim ou os seus espectadores é que o são!

quinta-feira, novembro 01, 2007

ROTA 66: A HISTÓRIA DA POLÍCIA QUE MATA



Caros amigos leitores estamos disponibilizando aqui o primeiro capitulo do livro ROTA 66: A HISTÓRIA DA POLÍCIA QUE MATA de Caco barcelos.


Ele é bem mais sangrendo do q o TROPA DE ELITE. Leiam e se gostarem comprem o livro.








1º Capítulo

A perseguição

A Veraneio cinza nunca esteve tão perto. A 200, 300 metros, 15 segundos: a sirene parece o ruído de um monstro enfurecido. Os faróis piscam sem parar. O farolete portátil de 5 mil watts lança luzes no retrovisor de todos os carros à frente. Os motoristas, assustados, abrem caminho com dificuldade por causa do trânsito movimentado nesta madrugada de quarta-feira, no Jardim América. A Veraneio, com manobras bruscas, vai chegando perto, cada vez mais perto dos três homens do Fusca azul. Eles estão na Maestro Chiafarelli e têm à frente uma parede de automóveis à espera do sinal verde para o cruzamento da avenida Brasil.

O motorista do Fusca azul, Francisco Noronha, sem tirar o pé do acelerador, reduz da quarta marcha para a terceira, em seguida para a segunda, e, ao girar o volante à esquerda, a roda dianteira bate no canteiro divisor de pista. Sem perder o controle, imediatamente ele gira à direita e segue em direção à calçada oposta. Sobe o meio-fio. Quase atropela um grupo de jovens, que tenta proteção junto ao muro. Ao desviar deles, por sorte, bate com a traseira em um poste na esquina. O Fusca se alinha sobre a calçada da Brasil, com a frente apontada à direita, que está livre para a fuga.

- Atenção, tigrão. Prioridade rua Maestro Chiafarelli. É Maestro Chiafarelli, QSL, tigrão? A prioridade agora é Maestro Chiafarelli. Três elementos Fusca azul. QSL. QSL, tigrão? Câmbio.

Os cinqüenta tigres estão espalhados pela cidade, cinco em cada uma das dez Veraneios cinza. Tão logo ouvem a ordem da Central de Operações, via rádio, começam a voar baixo em direção ao Jardim América.

Os tigrões que estão mais perto do Fusca azul são os da Rota 13. O ponteiro do velocímetro marca 110 quilômetros. O soldado motorista reduz, breca, gira todo o volante à direita. A Veraneio roda em um ângulo de 90 graus. Bate de lado na traseira dos carros que aguardavam a abertura do sinal.

Com o carro ainda em movimento, o soldado posiciona o câmbio na terceira marcha, em vez da primeira, e a Veraneio avança sem força alguns metros. O barulho das velas do motor acusa o erro até ele acertar a posição. Ao lado do motorista, o sargento comandante da Rota 13 tem o dedo indicador esquerdo grudado no botão da sirene. Com a mão direita, ele pega o microfone do rádio e grita ao operador da Central de Operações (Copom).

- Fusca azul agora na Brasil. QSL, Copom. Brasil! QSL?

- Positivo, tigrão. Brasil. Viva o Brasil!

O ruído da sirene está mais distante. Noronha tenta tirar vantagem da feliz manobra da esquina. Percorre todo o quarteirão forçando a segunda marcha. E, em uma outra manobra rápida à direita, faz o Fusca derrapar e perder o atrito de duas rodas no asfalto. Ao recuperar a estabilidade, percebe pelo retrovisor que está fora da visão da Veraneio.

Depois de alguns minutos sem ser visto pelos policiais, o Fusca segue pela avenida Nove de Julho, a 120 quilômetros por hora, com todas as luzes apagadas. Para entrar, bruscamente, na Estados Unidos, Noronha reduz, aumenta a rotação do motor e faz uma conversão proibida à esquerda. Quase colide com mais uma Veraneio que entra na perseguição.

O carro da polícia que desce a Nove de Julho, sentido contrário ao do Fusca, desvia, quase capota e, meio desgovernado, segue pela mesma rua. A velocidade dos novos perseguidores é tão alta que eles preferem, em vez de manobrar e retroceder, seguir em frente, entrar na primeira rua à direita, para tentar bloquear o inimigo pelo caminho paralelo.

Agora já são cinco Veraneios e 25 homens atrás do carro de Noronha. Ele sabe, pelo ruído das sirenes, que a perseguição está mais intensa, embora não veja, pelos espelhos, nenhum carro da polícia atrás dele. Mas, logo à frente, a sorte dos três homens do Fusca azul começa a mudar. Eles fogem pela Peixoto Gomide. Entram na Oscar Freire e, em poucos minutos, estão de volta à Nove de Julho, onde são surpreendidos pela barreira de uma viatura, parada no meio da pista, em posição oblíqua.

- Aqui Rota 66. Avistamos Fusca azul. Urgente. Câmbio.

- Localização Rota 66? Câmbio.

- Nove de Julho. Reforço, Copom, reforço! Fusca azul vindo em nossa direção.

- Atenção todos os carros. Rota, Tático Móvel, Radiopatrulha. Prioridade na rede é da Rota 66. Nove de Julho. Avenida Nove de Julho. Três elementos perigosos. Fusca azul. Atenção, viaturas...

À espera do inimigo, o motorista da Rota 66 acelera muito, sem movimentar o carro, ainda parado no meio da pista. Ao lado dele, no banco dianteiro, o comandante da equipe, sargento José Felício Soares, tem uma metralhadora sobre o colo. Atrás, entre dois PMs, está o soldado Antônio Sória. Ele se apóia no encosto do banco da frente, avança o corpo o máximo que pode para ver melhor a cena. Sória é o comunicador da Rota 66.

- Só dá pra ver dois. O passageiro está usando um chapelão. O motorista é cabeludo, deve ser maconheiro, QSL? Meliante cabeludo, QSL? Está vindo pra cima de nós! É agora, Copom, vamos pegar, Copom!

Duas horas antes de cruzar com os homens da Rota 66, os longos cabelos do menor Francisco Noronha estavam entre as mãos da namorada, Iara Jamra, que os acariciava enquanto ele fazia o que mais gostava na vida: namorar em um passeio noturno de carro, em baixa velocidade, ouvindo Yes, Pink Floyd, Led Zeppelin pelas ruas arborizadas da cidade universitária. Namoro monossilábico. De vez em quando, um ou outro baixa o volume do som, para poder ser ouvido.

- Que baraaato, Iarinha!

O namoro já dura três meses, tempo suficiente para Iara entender que o significado dessa expressão de Noronha é amplo. Pode representar qualquer coisa relacionada ao prazer de estarem juntos. Um elogio ao som, aos carinhos, à bela noite, aos momentos de curtição sem palavras. Observadora sensível, Iara gosta de interpretar o silêncio do namorado como um sinal de quem está muito de bem com a vida e amando a companheira. De tempos em tempos, ela também se declara apaixonada. Bem ao jeito que Noronha gosta de ouvir:

- Que legaaal, meu!!

O passeio termina em frente à casa de Iara. Noronha estaciona o Fusca, desliga o motor. Iara encosta a cabeça no ombro dele. Os dois fixam o olhar na lua cheia. Começam a recordar o dia em que se conheceram nessa mesma rua, uma rampa de asfalto, ponto de encontro dos adolescentes skatistas do bairro. Noronha subia de skate, agarrado ao pára-choque traseiro do carro de um amigo. Iara descia a rampa, deslizava em ziguezague, de minissaia, também equilibrada sobre dois pares de rodinhas.

- Garota skatista! Achei demaaais, Iarinha.

Para Iara, a escolha de Noronha tem um sabor de conquista, de vitória numa disputa declarada entre amigas. Noronha, aos 17 anos, é uma unanimidade. As garotas adoram o jeito, o charme do skatista radical. Inquieto, irreverente, às vezes rebelde. Não é exatamente um rapaz bonito: 1,68 metro de altura, ombros largos, corpo de atleta; cabelos castanhos e crespos, longos e despenteados, sempre repartidos ao meio e a barba por fazer.

Iara lembra da roupa que ele usava naquele dia em que o namoro começou. Calça Lee surrada com várias etiquetas cobrindo as partes puídas, camiseta Hang Ten, tênis All Star. Não por coincidência, a mesma dessa noite acrescida de um suéter de cashmere. Um uniforme rebelde, americanizado. Uma moda estrategicamente fora de moda, sucesso entre as garotas. Motivo do comentário irônico da namorada:

- Ô, meu! Você deve ficar hoooras em frente ao espelho se produzindo pra parecer que odeia se produzir.

- Pára com isso, Iarinha. O meu jeito é assim mesmo: largadão, não estou nem aí com a moda.

Noronha vive dizendo que odeia modismos e que não tem nenhum apego a coisas materiais. Os amigos traduzem isso como coisa de adolescente mimado, que sempre tem facilmente o que deseja. Os pais são generosos em presentes ao caçula dos dois filhos. Os amigos invejam o tipo de relação que Noronha tem com a família. Uma relação baseada no afeto, na liberdade, no diálogo sem limites, na confiança mútua. A educação familiar de Noronha explica o traço mais marcante de sua personalidade: um jovem seguro de si, com idéias avançadas em relação às dos amigos.

Mas, na hora de se despedir da namorada, Noronha revela que a autoconfiança só vai até certo ponto.

- Amanhã ao meio-dia eu vou buscar você na escola.

- Não precisa se preocupar, Noronha, eu volto sozinha. Eu até gosto mais.

- Quer você queira ou não, eu estarei lá.

Desde o início do namoro tem sido assim. O que antes parecia uma gentileza revelou-se mais tarde ser puro ciúme. Uma maneira de pressionar Iara a não cabular aula e de evitar que ela encontre alguém à saída da escola. Depois da cena de ciúme, Iara está decidida a sair do carro e não dá muita importância ao último diálogo deles, onde Noronha revela que - se tudo acontecer como está combinado com os amigos - esta noite, para ele, ainda será longa e agitada.

- Ô, meu! Você vai dormir cedo ou ainda vai pra gandaia?

- Vou ao Paulistano. Tem um lance aí. Periga pintar um gravador. Já temos um canal pra vender em Santos, coisa do Pancho.

- Não é barra-pesada, não, Noronha?

- Não se preocupe, será a última vez.

Antes de ir ao Clube Paulistano, Noronha resolve passar em casa, um apartamento espaçoso no sexto andar de um prédio de luxo da avenida Angélica. A família ocupa um andar inteiro. Os pais moram no apartamento 61. Ele e o irmão mais velho, Zezinho Noronha, dividem o 62, que fica em frente. Os dois estão amigos nesses dias. Passaram juntos o último feriado de Páscoa, com suas garotas, numa praia de Santa Catarina. A viagem tinha sido maravilhosa.

- Dá pra você me emprestar uma grana? Mixaria, quero comer qualquer coisa. Devolvo amanhã, seguro.

- Não está dando, mano. Tenta com a mamãe.

Noronha acha que não é o caso, já tinha recebido a mesada reforçada para viagem à praia. Resolve sair assim mesmo. Passa rápido no 61, e avisa.

- Tchau, mãe!

- Não demora, Chiquinho, quero conversar com você ainda hoje.

- Não vou demorar, mãe.

A chegada de Noronha sempre agita a turma do Paulistano. São quarenta, cinqüenta jovens que se reúnem diariamente no lado de fora da entrada do clube, um dos mais elegantes da zona sul da cidade de São Paulo. Nos fins de semana, à tardinha e à noite, o número é bem maior. Maioria rapazes saindo da adolescência. Eles freqüentam a turma antes ou depois de namorar. Há duas condições mínimas para alguém ter acesso ao grupo: ser refinado ou metido a refinado. E agressivo, como Noronha, do tipo que não leva desaforo para casa. Nesta noite planejam um ataque aos arquiinimigos do Clube Pinheiros, uma turma dominada por esportistas de pólo aquático. Gomalina, um dos líderes do Paulistano, é contra o plano. Com a chegada do melhor amigo, Noronha, seus argumentos são reforçados.

- Ô xará, querem atacar o Pinheiros. Não estou achando legal...

- Você está certo, Goma. O pessoal do pólo nada 5 mil metros só pra aquecer.

Eu não estou a fim de esforço esta noite, que está tão legal...

- Ainda se fosse contra os bundões do Harmonia, não é, xará?

- Você está sabendo da última?

- Os comunistas do Vietnã estão vencendo a guerra...

- Não brinca, xará!

- Os americanos já estão fugindo hoje de Saigon...

- Stop, Rolling Stones. Stop, Beatles sound. Rá-tá-tá-tá!

- 22 de abril de 1975. É uma data histórica, xará!

- Acabou o rá-tá-tá-tá, pessoal. Vamos festejar a paz no Hamburguinho.

Apenas três rapazes gostam da idéia. Pancho, Noronha e Gomalina pedem a especialidade da lanchonete: choco-lamour, um sorvete de chocolate, com pó de avelã e paçoca, bem caprichado. Noronha pede também um cheese-tártaro. Pancho, o mais baixo e gordo dos três, quer um cheese-salada, com muita maionese. Gomalina fica só no sorvete, já que tem pouco dinheiro.

- Ô, xará! Tentei arranjar mais grana, mas... Vou ficar te devendo essa - diz Noronha ao amigo Gomalina.

- Não tem nada, não. Essa dureza vai acabar. Papai vai ganhar uma causa contra o Fisco Federal. É uma nota preta.

O pai de Gomalina tem a concessão de uma linha de montagem de carros importados. A causa na Justiça é devida à apreensão de 58 automóveis Chrysler, que entraram no país ilegalmente. Ninguém sabe se o julgamento será favorável ou não ao pai de Gomalina. Mas o filho, que se define como hippie, embora use o cabelo à la Elvis Presley, topete à base de um creme brilhante, a gomalina, já sonha alto com os dois amigos.

- Fechado! Vou comprar uma fazenda, perto de um rio. E montar ali a maior comunidade hippie do mundo...

- E à noite a gente faz uma mesa enorme, todo mundo vestido de branco, de smoking branco. Todas as pessoas que a gente gosta vão morar na fazenda - diz Noronha.

- Nunca mais vocês deixarão de poder pagar um sanduíche ao amigo... nunca - Gomalina fala triunfante.

- Você me dá uma moto 750? Se você não der, nunca mais falo com você. Se não quiser dar, pelo menos me empresta o dinheiro? - pergunta Pancho.

- E o que mais a gente pode fazer com esse dinheiro? - questiona Noronha.

- Bancar o Robin Hood, fazer instituição de caridade, casa pra velhinho - responde Pancho.

Noronha vibra com a idéia e bate com a colher do sorvete no balcão, ao ritmo de Raul Seixas:

- Viva! Viva! Viva a sociedade alternativa!

A volta ao Paulistano tem um objetivo definido pela vontade de Pancho. Ele quer cobrar uma dívida de um rapaz da turma, Roberto Carvalho Veras, que sumiu desde a semana anterior quando perdeu várias apostas no jogo de crepe. Era um bom dinheiro, perto de 100 dólares. Pancho acha que levou um calote. Está revoltado, disposto a se vingar.

- Seguinte, de hoje não passa. Temos que aprontar uma contra esse cara. Noronha gosta da idéia.

- Sei onde ele mora, que tal?

Gomalina é cinco anos mais velho e suas opiniões são respeitadas pelo amigo, que já o admirou quase como a um ídolo. Desta vez, porém, a tentativa de convencer Noronha a desistir do plano não está dando certo. A adesão de João Augusto Junqueira, superamigo de Pancho, tornam as coisas ainda mais difíceis. Mas Gomalina insiste.

- Deixa isso pra lá. Eu vou passar em casa, arranjar um dinheiro e a gente vai comer qualquer coisa no Piolim...

- Fica na tua, xará. Esta parada é nossa. O My God pode te dar uma carona.

- Tudo bem. Mas eu acho que o Pancho tem que tirar esse sombreiro. Chama a atenção demais.

O carro já está com o motor funcionando e Pancho, sentado ao lado de Noronha, nem ouve o conselho de Gomalina. No banco de trás, Augusto Junqueira brinca, como se estivesse se preparando para o início de uma corrida automobilística:

- Sinal vermelho. Acelera. Acelera. Noronha na pole position! Amarelo. Atenção, vai dar a partida...

O relógio luminoso no alto de um prédio da avenida Paulista marca 02:34, quando Noronha faz o Fusca cantar os pneus, numa arrancada brusca, em direção à aventura.

Cinco minutos depois eles já estão em frente ao número 46 da rua José Clemente, a casa de Roberto Carvalho Veras. O alvo deles é um Puma que ocupa quase todo o pequeno quintal do sobrado sem garagem. Os três pulam o muro de 1 metro de altura, sem fazer barulho, e tentam abrir o carro. Um deles consegue. Entra com a cabeça e o peito pela janela do Puma e começa a forçar o painel para retirar o toca-fitas.

A rua está escura neste trecho. O céu nublado esconde a lua cheia. As lâmpadas de vapor de mercúrio, presas aos postes de concreto, estão encobertas pelas folhas das árvores. Na escuridão, a Veraneio cinzenta é quase invisível. Lanternas e faróis apagados, motor na marcha lenta, a Rota 13 se aproxima devagar, silenciosa. Quando os três rapazes perce , já é tarde demais.